Tivemos, nesta semana, um fato político de grande importância, embora ignorado pela propaganda midiática.
Fuente: Carta Capital
O ex-presidente avisa: se voltar à Presidência, vai convocar um referendo de revogação de muitas medidas tomadas por Temer. Por exemplo, a PEC-55
Quem se informa somente por meio da “grande imprensa” talvez nem tenha ficado sabendo, mas isso não diminui a relevância do que aconteceu. Demostra, apenas, mais uma vez, a péssima qualidade da informação que os conglomerados de mídia servem ao País.
Entrevistado pelo jornal El Mundo, da Espanha, Lula declarou que, caso seja eleito presidente em 2018, pretende “(…) implementar um referendo de revogação de muitas das medidas aprovadas por Michel Temer”. Exemplificou com o caso da PEC 55, promulgada em dezembro do ano passado: “É criminoso ter uma lei que limite a possibilidade de investimento por 20 anos”.
Pelo tom da entrevista e de declarações posteriores, fica claro que essa não é a única medida que, em sua opinião, teria de passar pelo crivo da sociedade. Seriam muitas as mudanças propostas pelo governo Temer que só permaneceriam se recebessem o endosso da maioria.
O ex-presidente usou com propriedade o conceito de referendo, previsto na Constituição quando um ato legislativo ou administrativo é submetido ao escrutínio do povo, para ratificação ou rejeição. É a saída que resta nos casos em que não houve consulta prévia, através de plebiscito.
A manifestação de Lula é duplamente importante. Em primeiro lugar, por vir do candidato que lidera todos os cenários, em todas as pesquisas para as eleições presidenciais de 2018. Tem ampla folga no voto espontâneo, nas várias opções de voto estimulado e nas simulações de segundo turno. Deixa os adversários atrás mesmo nas pesquisas desenhadas de maneira a subestimar seu potencial de voto.
Quem falou foi, portanto, o favorito a vencer as eleições e a tornar-se presidente da República, pela terceira vez, daqui a menos que um ano. Não um personagem secundário, daqueles que engatinham nas preferências dos eleitores.
O que Lula disse é importante também por outra razão. Ao anunciar um referendo, ele indica que a opinião da maioria será ouvida e respeitada, que não serão mantidas inovações legais ou administrativas que não contem com o apoio da população. Que a reprovação de algumas será mais do que uma porcentagem nas pesquisas.
É difícil dizer o que restará, feito o referendo, do carnaval de reformas dos últimos 15 meses. Tudo indica que nenhuma permaneceria intocada e que a maioria seria rejeitada. A tomar pelas pesquisas disponíveis, as reformas de Temer são quase uma unanimidade nacional negativa.
A promessa de Lula abre uma perspectiva funesta para o reformismo do atual governo e seus aliados no empresariado, na mídia e nos aparelhos de Estado, de 2019 em diante. Ao mesmo tempo, cria um horizonte complicado no curto prazo, seja para a agenda, seja para o próprio Temer.
Na medida em que sua imagem e condição governativa foram se deteriorando, a sobrevivência de Temer passou a depender, crescentemente, de sua agenda. A cada denúncia nova, respondeu com a proposta de novas reformas, mesmo se pouco estudadas, mal planejadas ou indesejadas. Sempre para agradar a seus parceiros no mercado financeiro, nos oligopólios da mídia e nas corporações politizadas da burocracia.
Quem quis, acreditou que era para valer. Que um governo sem legitimidade e condições morais seria capaz de realizar, a toque de caixa, um pacote de reformas regressivas, antipopulares e, simultaneamente, duráveis.
Deu tudo errado nos planos das elites quando derrubaram Dilma Rousseff e reassumiram o controle do Estado: não acabaram com Lula, não aniquilaram o PT, perderam as velhas lideranças e não criaram novas. A agenda que quiseram implementar não funcionou e foi rejeitada. Talvez não dure mais do que alguns meses.
O saldo do efêmero carnaval que fizeram é pequeno. Se o líder das pesquisas afirma que só restarão as reformas que o povo desejar, que ânimo terá o atual Congresso para aprovar outras? Sem sua agenda, qual o futuro de Temer?
Na democracia, cabe às elites reconhecerem que é impossível mandar sozinhas, impondo os interesses dos muito ricos à coletividade. Fora da democracia, o caminho pode ser mais fácil: basta ordenar a seus prepostos que as salvem do povo.